Alguma Literatura

Alguma Literatura

sexta-feira, 30 de março de 2012

Acorda, mãe




Você tá sempre cansada
Nunca mais brincou comigo
O tempo todo deitada,
Nem sai mais com seu amigo.
Mas, faz dois dias, agora.
Que você já não acorda.

E eu quero o meu leitinho
E trocar o meu xixi.
O pão, já comi todinho
Não sobrou mais nada aqui.
Já faz dois dias inteiros
Que não pego um chuveiro.

Você também tá fedendo.
Vamos banhar com sabão!
O que tá acontecendo?
Não gosta mais de mim não?
O que eu fiz de errado?
Eu não quis quebrar o vaso.

Juro ser um bom garoto
- acorda logo mãinha –
Vou deixar de ser maroto
De subir na escrivaninha.
Vou comer tudo do prato
Até cenoura e nabo.

Mas acorda logo, vai!
Juro que não faço birra
Nem pergunto de meu pai
Que se eu falo você briga
Chora sem ter nem pra quê...
Dele não quero saber!

Por que você não espanta,
As moscas da sua cara?
Eu espanto, mas é tanta
Que nunca nunca se acaba.
Acorda logo mãinha,
Vem chegando a noitinha.

Tenho medo do papão
E dos monstros que eu vejo
Só na imaginação.
Mas imaginar dá medo!
Inda mais quando você
Não vem pra me defender.

sábado, 17 de março de 2012

Pelo telefone





Fui, naquela noite insone,
pelo silêncio domado
silêncio que foi cortado
ao soar o telefone.

Como  fio que tudo corta
com paixão de mil amores
com seus sons e suas cores
Natal entra pela porta.

Rogo-lhe “não me abandone”
“Não o farei”, ela diz
trazendo, leve e feliz,
com ela a voz de Simone.

E lembranças que comporta:
o tempo a caminhar lento,
o sol e o cantar do vento,
som de amor que ao mar transporta.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Injustiça






















Se Deus não me regalou com a alegria
Dos súditos de Momo, por que me aflige,
Ano a ano, com o banzo
Da quarta-feira de cinzas?
Estação
Primeira
De Mangueira
Nota
DEZ

domingo, 11 de março de 2012

Mata densa (sem maquiagem)


Mata densa. Campos e bosques, parentes distantes. Aquela, em sua densidade, desconhece cantos e ninfas, dependentes do ar fresco desses outros. Mata densa, sufocante,  produz sua própria mitologia. Uma teogonia bárbara, produz – Ordenhava quando sentiu dores. Acocorada, fez força três vezes. Pariu-se – Seu discurso: um não-discurso. Ideias interrom... Sons   da Mata. Chia  chiado  chia...  Aquela  pausa; uma  censura? E  aqueles  gritos? Adesão? Protesto? Mata densa. Densíssima ma... Folhas, se secas no chão, pedem queda escorregão. Galhos, pancada. Cobras: “Pise em mim, pise em mim!”. E Céu? O que pede? De trás das copas manda recado.   Gotas tímidas ferem tambores. Vozes-Aves: “Vou embora, sei se volto não! Vou embora...”.  Chuva     aperta. Rio avança à margem. Exibe, cheio  de  si, apoio angariado do Céu. Ronca. Mata cede.  Sua sina ceder – Garoto, em suas fraldas, para diante da porta entreaberta. Quarto se insinua pela fresta.  Hesita.  O que,  lá dentro? Entro,  papai? Entrou. Nem  ouviu. Sina dos quartos escuros ceder à curiosidade dos  meninos -  Mata quarto escuro ar parado. Sua sina ceder ao ronco da motosserra. Dorme  acorda  bosque. Dorme acorda campo. Corte Raso.

Mata densa


segunda-feira, 5 de março de 2012

Ciranda




Criançada em viva roda, cantoria de cantiga, canta versinho da moda, sem soltar a mão da amiga. Redondo fluxo que contorna o centro pleno de som, harmonia salpicada, aqui e acolá, por riso, ou grito de improviso, ou escorregão no piso, e ao normal tudo volta: “volta e meia vamos dar”. Vindo pela contravolta, do horário ao anti-horário, a brincadeira prossegue. E agora ainda mais viva, pois ali não há quem negue que o anel era de vidro e por isso se quebrou nem tampouco que o amor, que alguém tinha, era pouco e se acabou. O bom balanço da trança toda ornada com fita azul – leste, oeste, norte e sul – faz o testemunho da dança de circular feitio e inocência pueril. 

quinta-feira, 1 de março de 2012

De viagem (o oco da lembrança)

E avante fui seguindo
No sobe e desce da estrada
Ora indo, ora vindo
Na mente a mulher amada

Botei mil léguas nas costas
Cidades mais outras tantas
Perdi a conta das santas
Que avistei em andor expostas.

Rio, riozin, riacho, arroio
Lago, laguna, lagoa
Água (da ruim e da boa)
Já lavou esse meu rosto.

Pinto-Silva, Bem-te-vi
Sabiá ou Curió
Urubu - que vê melhor -
Nenhum viu o que eu vi

Vi o ermo bem de perto
Vi o verde e o deserto
Gente que parece bicho
Vi buniteza e lixo.

Tudo é alembramento:
Estrada, rio, bicho, andança.
A vida é uma lembrança
Que quer o esquecimento.