Alguma Literatura

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sábado, 23 de agosto de 2014

PESQUISA SOBRE A DESCOBERTA DO SEGUNDO SOL





Assunto: RE: Pedido de matérias so...
De     : vivian_bibliotecaria@u...
Para   : a-candido@t...

Sr. Artur
Segue a matéria mais antiga que temos em nosso acervo digital sobre o tema do seu interesse. Ela foi publicada na edição de 8 de maio de 1950 dO Cruzeiro.
Infelizmente, algumas passagens estão ilegíveis e a segunda metade se perdeu.
Att
Vivian

“*RINTA ANOS DA EXPEDIÇÃO COSTA-MAIA: A descoberta do Sol recôndito. Por Amanda Ribeiro.

Hoje se sabe que a existência do segundo sol foi notada no ano de 1589 por Antonello Romano, o primeiro a adotar um método inusitado no estudo do astro-rei: olhar dir***mente para ele por horas a fio. Antes de queimar suas retinas, *ntendeu que não havia um, mas dois sóis *****
Ciente do caráter polêmico da descoberta, o erudito milanês a manteve em segredo por toda sua vida. Ignorava-se que seu curiosíssimo livro Conpendium (1603) - escrito em um idioma indecifrável e repleto de ilustrações de máquinas, ***sagens e animais imaginários - continha uma minuciosa descrição de sua descoberta. Por mais de um século, o Compendium foi visto apenas como um livro estranho. Um passatempo para crianças, fruto do ócio de um rena*****ista cego e do talento do pouco conhecido gra*urista Enrico Conti.



Coube ao professor Xisto Mendes traduzi-lo.
Esse surpreendeu o mundo ao solucionar, aos vinte e três anos, o enigma do pergaminho de Foix, que continha a tradução, para o espanhol seiscentista, de um trecho de quinze palavras do Compendium. Como se tratava de um fragmento solto, sem a ident****ação do capítulo e da página, o problema (até então considerado insolúvel) consistia em se determinar a que passagem do Compendium ele correspondia. O tom laudatório do texto levara os estudiosos a crer se cuidar de um excerto da dedicatória. O jovem pro***sor demonstrou o erro e foi além. Provou se tratar da *radução das primeiras palavras do quinto parágrafo do capítulo segundo, conhecido como ‘capítulo dos homens-pássaro’. ***** A comunidade acadêmica se encantou com o ‘Gênio de Ouro Preto’ e lotou auditórios em suas duas excursões europeias. O seu carisma e juventude transformaram uma obscura charada filológica em assunto dos mais comentados. Mas a curiosidade se dissipava à medida que o tempo passava e a prometida tradução integral do Compendium não vinha à luz. Hoje se sabe que o capítulo 31, que contém a *ombástica revelação da existência de um segundo sol, pareceu-lhe absurdo.




E ele não o repudiava apenas por suas conclusões.
Também o seu estilo soava deslocado do resto da obra, a qual era abertamente imaginativa, ficcional, poética e irraci**alista. No capítulo 30, por exemplo, havia um manual de reparos e consertos de máquinas de desencaixotar pores-do-sol. No 32, um relato dos hábitos al**entares de um animal híbrido chamado girafante. Já no 31, e eis o motivo do espanto, brotava uma lúcida e metódica descrição dos meios pelos quais Antonello Romano chegou à conclusão de que existiam dois sóis. A exc*****cidade desse capítulo o fez duvidar da confiabilidade dos seus exemplares do Compendium. Como adquirisse diversos outros – de diferentes épocas e países – e o problema persistisse, passou a duvidar da autenticidade do pergaminho de Foix. Mas em não descobrindo nada contra a idoneidade do documento, passou a questionar seu próprio método de tradução e, por fim, a própria linguagem.





Doze anos de incessantes esforços e tentativas levaram-no à loucura. Lívia, sua única herdeira, encontrou entre os papéis do pai quatro cadernos onde se ***** ‘Compe***** de Milão’. Eram quase oitocentas páginas escritas em português. Esses ***** que hoje integram o acervo da Fu**ação José Altamiro, são um confuso emaranhado de rabiscos, rasuras, notas, versos e ***** Em diversos pontos, frases foram apagadas e reescritas até rasgar o papel. Folhas foram arrancadas e subst*tuídas por textos que, acredita-se, narram o que o professor Xisto *entiu ao mastiga-las, engoli-las e digeri-las.
Com bravura, Lívia completou as lacunas e publicou o famoso ‘Compendium de Milão traduzido pelo professor Xisto Mendes’. As notas sobre o segundo sol passaram a circular em separado em diversas edições não autorizadas. Até hoje os **tudiosos dimensionam o impacto do capítulo 31 na história do pensamento ocidental. São incontáveis as referências deixadas na literatura. É de sua fase trintaeunzista, por exemplo, o célebre poema de Galeano:

SOBRE O MOVIMENTO

Ao andar e olhar pra trás
Eu vejo a cada instante
Os pontos onde não mais
Estão meus ossos, meu sangue.
Penso, ao apertar o passo:
Mas como é possível, enfim,
Que eu corra sem que o espaço
Emporcalhe-se de mim?
Insisto, por picardia:
Por atravessar o nada
O nada se alojaria
Aos poucos na minha alma?

Como também é trintaeunzista ‘Atlântida’, obra maior da comediógrafa Jane Woods, onde há o impagável diálogo entre Carvalhosa, o explorador, e Nélida, a atlante:

- Você vive no cont**ente perdido?
- Curioso... Era isso mesmo que eu ia lhe perguntar!

E não haveria um ar ocultista e, por isso mesmo, trintae******* nos versos

Há um continente oculto
Assinalado, em mapas antigos,
Com a cifrada expressão
‘outras coisas’ *****
Os cartógrafos modernos, alheios
Ao segredo, suprimiram a observação.
Ele é banhado por um oce*** secreto
As cartas náuticas registravam
‘outros mares’
Hoje nada mais registram.
*****
No branco mais branco da página
Em branco
Contorcem-se universos arredios.

De Blackstone? *****



Fica demonstrado, ao menos é o que entendem os cientistas trintaeunzistas, que existe, e sempre existiu, um segundo sol, e que seu reduzido tamanho e a proximidade da estrela principal impossibilitam sua observação em condições normais. ***** Mas haveria, segundo os cálculos de Romano, um ponto do globo no qual ele seria visível por alguns minutos a cada sessenta e sete anos. Trata-se de um ponto no meio do ***”

quarta-feira, 25 de junho de 2014

O CAÇADOR


O CAÇADOR

Calou.
"Quando vai começar?"
Resmungara o aprendiz.
Isso (a espera) já é a caçada.
Já como ter um lápis e olhar o papel
é poesia.

quinta-feira, 29 de maio de 2014

(OCULTA) SOB A PELE




(OCULTA) SOB A PELE

E lavou o rosto.

Tirou a roupa,
os anéis
e os brincos

Despiu-se de tudo,
mas não conseguiu
ficar
nua.

terça-feira, 1 de abril de 2014

PARA ESCREVER NUMA CAMISETA



1
Provavelmente estou mentindo.
♥♠♣♦

2
Desculpe, não falo português.
♥♠♣♦

3
Minha outra camisa é de marca.
♥♠♣♦

4
Posso atrapalhar?
♥♠♣♦
5
Minha outra camisa está limpa.
♥♠♣♦

6
Deixei meu smoking no iate.
♥♠♣♦

7
Quer um abraço? Eu não.
♥♠♣♦

8
Não podem provar nada contra mim.
♥♠♣♦

9
Não me siga. Também estou perdido.
♥♠♣♦

10
Não fui feito na China.
♥♠♣♦







segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

LABIRINTO NA RODOVIÁRIA



Seria possível, num relance, descobrir as armas de sedução de uma desconhecida?
Observemos, por exemplo, essa mãe solteira a esperar seu ônibus. Ela conversa com a irmã enquanto fiscaliza o rebento. Fumante, entre uma e outra frase volta a face ao firmamento e bafora.
A tia provoca o garoto, que se agarra nas pernas da mãe. Essa usa as coxas para encorajá-lo a falar. Suas coxas dirigem os movimentos de sua cria melhor do que fariam suas mãos? Elas poderiam governar o mundo, tamanha sua confiança. Com elas é que ela pretende controlar os homens?
Temo não podermos tirar conclusões de um gesto tão efêmero.
Também seria inútil tentar interpretar sua forma de conter a criança, quando essa se impacientou com a demora da tia: “A dinda já vem! Calma, ela vem já já!” Constrangida, sorria para estranhos como a lhes pedir aprovação ou ajuda. Ou a propor-lhes uma frágil aliança fundada na estranha cumplicidade que certos adultos nutrem entre si, quando se trata de disciplinar os pequenos. Os ecos desse comportamento chegariam à alcova? Se sim, quais seriam eles? O mudo pedido de ajuda a completos estranhos denunciaria uma amante egoísta, focada apenas no seu próprio prazer? Ou seria a necessidade de aprovação indício de uma personalidade fraca, propensa mais a ceder do que a exigir?

Mais um beco sem saída. Melhor cair fora.